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Acabei a manhã de hoje a sentir-me, não sei ... pequenina, miudinha, chaaaata. As razões:
1. A minha vizinha de baixo é uma jóia de pessoa. Tão boa, tão boa, tão boa que, quando lhe esmurrei o carro a estacionar o meu e lhe implorei repetidas vezes que me deixasse pagar o arranjo, me ignorou, disse que não liga nenhuma ao carro - desloca-se quase sempre de bicicleta, que inveja - e, se não me engano, nem mandou pintar os riscos. É tão boa, tão boa, tão boazinha que faz de tudo para evitar situações menos agradáveis e nunca, mas nunca resolve nada, pelo menos os assuntinhos desinteressantes mas essenciais ligados à gestão de um pequeno condomínio que têm que funcionar impecavelmente para se manter o bom ambiente. Dá-se o caso de, quando na noite de S. João regressámos da bela festa, termos dado com a escada do prédio toda cagada sem nenhuma possibilidade de os responsáveis serem outros que não ''a vizinha''. Depois de vários dias sem ela ou outro em seu nome ter tomado a iniciativa de pegar numa vassourinha e limpar a terra do chão, mandei-lhe uma SMS a pedir que por favor, resolvesse a situação. Resposta ''estou fora de Portugal há duas semanas, chego no domingo e resolvo. É o meu irmão que está lá em casa.'' Eu contra-ataco, em tom irritado, ''Esqueça, não dá para deixar esta porcaria até domingo, eu limpo, boas férias.'' Ela outra vez ''Estou fora de Portugal a trabalhar mas vou falar com o meu irmão''. Eu, para rematar ''OK, desculpe ter incomodado, um beijo.''
É que a minha encantadora vizinha é médica e - embora isso em nada mude a substância da coisa que é, se patinhas um lanço de escadas com terra é simpático varrer de seguida - imaginei-a a ler a minha SMS enquanto uma criança de um país pobre agonizava à espera que ela a pudesse atender e de repente senti-me, sei lá, mesquinha. Acabei como das outras vezes, a pedir desculpa pelo incómodo.*
* outras vezes = não poder colher ervas aromáticas do meu pátio porque os gatos dela mijam tudo, ter cuidado a entrar no pátio com os miúdos porque o cão dela espalha cagalhotos por todo o lado e ela não limpa, acordar vezes sem fim a meio da noite com os ganidos e pontapés que o cão - muito fofo, por sinal - dá na porta quando ela faz noite e o deixava sózinho em casa. Só que ela é tão boa pessoa, tão peace and love, tão zen que quando tento pedir-lhe que cumpra com aquilo que prometeu e implore ao cão que nos deixe dormir, acabo sempre a pedir desculpa pelo incómodo.
2. Sim, há mais: o estacionamento na nossa rua está a ficar uma selva e, quando cheguei ao carro, havia outro a impedir a saida. A impedir, mais ou menos, porque se eu não me importasse de subir um passeio, conseguia tirá-lo de lá. Mas eu, que subo aquele passeio vezes sem conta quando me convém, hoje, sei lá, não tive vontade. Talvez por me ter lembrado de que ontem o meu marido não conseguiu sair para levar o A. à escola por causa de outro carro que lá estava a impedir a passagem, que chamou a polícia mas ao fim de quarenta minutos de espera desistiu e levou o outro carro. Vai daí eu, antes de zarpar com o carro passeio acima e estrada afora, agarrei num papel e deixei no pára-brisas do infractor um bilhete inflamado que dizia mais ou menos ''se com a sua falta de civismo voltar a impedir a passagem do meu carro, não se espante com as consequências''. Acham que o dono/a terá ficado assustado?